segunda-feira, 21 de outubro de 2013

Os primórdios

Pelo que se conclui da página da história do Guanabara F.C., na génese da sua fundação estiveram os "Marinhos F.C.", cujos atletas, ainda juvenis, deram os primeiros "toques" nos pelados junto à Igreja Paroquial de Cedofeita inacabada e, mais tarde, no alcatroado junto à Igreja românica.

Na década de 60 do século passado ainda a Igreja Paroquial de Cedofeita não estava acabada conforme esboço aproximado que se apresenta a seguir, elaborado de memória e sem preocupações de respeito pela escala (clique no desenho para o ampliar).

E foi ali, na década de 50, naquele espaço assinalado com o nº 11 que começaram os primeiros "driblings" daqueles que, mais tarde, viriam a ser autênticos "Cristianos Ronaldos" do futebol amador. Outros, nem por isso...
Com efeito, aos Domingos à tarde, os párocos da altura, padres Carlos e Aníbal, fechavam os portões e realizavam grandes "peladinhas" com bola de trapos, sem qualquer intromissão da "bófia". Cada um deles intregrando a sua equipa, incentivavam a "ganapada" e empenhavam-se na obtenção de vitórias folgadas sobre o adversário.
Ainda me recordo de, por vezes (com 7 ou 8 anos), me agarrar às batinas deles, para lhes tentar "roubar" o "esférico".
Julgo que, nessa altura, toda a miudagem da zona ia à missa de Domingo com receio de não vir a ser convocado para o jogo dessa tarde.

No início da década de 60, aqueles dois padres "bacanos" foram transferidos para outras paróquias e, para os substituir, chegou o Abade Martins (mais tarde Bispo de Setúbal) e acabaram as famosas "peladinhas" dos Domingos à tarde.
Assim, a miudagem, para quem o futebol com bola de trapos era o equivalente, nos dias de hoje, a uma boa playstation ou a um telemóvel 4G, não tiveram outra alternativa que não fosse vir jogar para fora do adro, no terreno assinalado no esboço com o nº 12, mas o constante alerta por causa da "bófia" originava muitas falhas de concentração, qual Benfica dos últimos tempos.

Eu nunca tive grande habilidade para a bola, mas como raramente havia voluntários para a baliza, lá me escolhiam a mim para defender as "redes" de uma das equipas e, todas as que vinham..., era vê-las passar!

Ali por perto, depois da Praça Pedro Nunes (Liceu D. Manuel II/Rodrigues de Freitas) e subindo a Rua da Paz, chegava-se ao Largo da Paz onde havia um fábrica de cordas (julgo eu), cujos trabalhadores, que de regresso a casa no fim do dia de trabalho passavam pela igreja de Cedofeita, se juntavam no passeio às dezenas para verem a "ganapada" a exibir a sua mestria na arte de manobrar a bola de trapos.

Ainda que nos encontrassemos a jogar fora do recinto da Igreja, o Abade Martins não se coibia de telefonar constantemente para a esquadra da P.S.P. de Cedofeita, verificando-se, por vezes, autênticos cercos policiais à miudagem, como quem cercava um gang de perigosos mafiosos!
Talvez por estas e outras razões é que toda aquela miudagem deixou de frequentar a catequese e as missas de Domingo.

Recordo-me até de, certo dia, após um desses cercos, o Fausto (já falecido e que morava no Bairro dos Marinhos), ter conseguido escapulir-se para o Largo do Priorado e, um carro da polícia a todo o gás e de sirene ligada, ter surgido da Rua Aníbal Cunha, vindo em sentido proibido até à Igreja Românica à cata do Fausto, incrível!



O Fausto, já farto de tanto espalhafato, resolveu sair dos arbustos, aonde se havia escondido, e dirigir-se lentamente para o caramanchão, onde se sentou e aguardou serenamente a "bófia".
Nessa altura já devia andar pelos 17/18 anos de idade.
Lá lhe aplicaram uma multa de 80$50 (oitenta "paus" e 5 "tostões") que teve de depositar mum tasquinho que havia ali perto.




Em meados da década de 60 iniciaram-se as obras de conclusão da igreja, as quais tinham começado nos inícios do século XX, mas que, por motivos vários, haviam sido interrompidas e a obra ficado a meio, facto ao qual nós, na altura, atribuíamos a origem do nome de "Cedofeita" (ver página "curiosidades").

Devido ao início dessas obras, a "ganapada" viu-se privada do campo de treinos defronte da igreja paroquial, passando a utilizar o campo alternativo defronte da Igreja românica.

Nesta altura, já os pêlos da barba começavam a aparecer na "ganapada" e os treinos passaram, então, a debruçar-se sobre aspectos mais técnicos, incidindo, sobretudo, na marcação dos pontapés de canto.

A rapaziada cotizava-se (5 tostões a um, 5 tostões a outro...) e lá se comprava uma bola de plástico para o efeito.
A baliza era na porta da igreja românica, onde o Tibério se colocava. À vez, cada um dos atletas presentes ia marcar o canto e os restantes, em frente ao Tibério, tentavam marcar golo. Só com jogadores atacantes e nenhum defesa, o Tibério não "via uma" e alguns dos "pontas de lança" até se davam ao luxo de experimentar golos altamente artísticos.
Não havia hora marcada para o fim do treino e este só terminava quando a bola rebentava, ou quando aparecia a "bófia", também aqui chamada pelo Abade Martins.

E foram em condições idênticas a estas que nasceram para o futebol muitos dos jogadores que deliciaram o público nos estádios de todo o Mundo; Di Stéfano, Pelé, Eusébio, Maradona, etc..

AM - Outubro/2013

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